Sabe quando você tem a sensação de que o tempo não está avançando? Às vezes, suspeito de que ou progredimos em espiral ou damos sempre um passo para frente e dois para trás. Pior: admito também a possibilidade de andarmos em círculo. São tantas questões que já deveriam estar superadas! São tantos problemas que já deveriam estar resolvidos! Realmente, temo que a humanidade não esteja evoluindo.
Reconheço que se trata de uma abordagem teleológica. Pode ser que não haja nem precise haver um destino para os seres humanos, um futuro melhor para o qual todos caminhem, mesmo que a passos de tartaruga. De qualquer forma, muita gente vive em função dessa esperança. Muita gente crê em uma evolução para o homo sapiens sapiens. Muita gente deseja e busca esse progresso. Seriam uma crença, uma expectativa, um desejo e uma procura vãs?
Minha sensação pessimista de que a humanidade não está avançando baseia-se, sobretudo, como já antecipei acima, na observação de questões que já deveriam estar superadas e problemas que já deveriam estar resolvidos há muito tempo. Cito dois exemplos apenas: racismo e homofobia. Não quero sequer resgatar a história para não me alongar demais. Portanto, nada de tentar expor aqui as origens do preconceito e da discriminação baseados na cor da pele ou na orientação sexual das pessoas.
Detenho-me no absurdo de ainda haver a necessidade de convencer seres humanos do fato, o qual deveria ser intuitivo e óbvio, de um indivíduo não ser pior que outro porque tem a pele negra ou vermelha ou amarela ou porque sente mais ou menos atração por quem é de seu mesmo sexo biológico. O que isso afeta o caráter e a inteligência de uma pessoa? Ainda que afetasse, por que afetaria negativamente?
O mais curioso é que, muitas vezes, essa postura preconceituosa e discriminatória parte de gente religiosa, ou seja, supostamente fiel a um deus misericordioso, amoroso, generoso e, ainda por cima, onipotente, onisciente e onipresente. Um deus que pode tudo, sabe tudo e está simultaneamente em todos os lugares deve conhecer tudo sobre todas as pessoas e, mesmo assim, amá-las indistintamente. Seus fiéis, porém, sentem-se no direito de agir de maneira oposta. Não deveriam ser à imagem e semelhança de seu deus?
Claro está que não são apenas religiosos que alimentam em si mesmos e em outras pessoas a repulsa — e não raramente o ódio — baseada em cor de pele e orientação sexual. Numerosos ateus e agnósticos também compartilham de racismo e homofobia. Esses não têm sequer um livro sagrado no qual se apoiar para estabelecer o certo e o errado. Adotam teorias pseudocientíficas ou argumentos falaciosos. Nada disso resiste a uma reflexão sóbria e profunda. Só que reflexões lúcidas e bem fundamentadas não são sempre a bússola da humanidade. Muitíssimas vezes, são as crenças — por mais absurdas que pareçam — a ditar as normas sociais.
Para muita gente, primeiramente vem aquilo em que se acredita e, só depois, a reflexão, o raciocínio, a fundamentação para justificar a própria crença. “Creio, logo existe” seria o bordão mais adequado para quem se sente confortável com as próprias ideias preconcebidas, supostas, não testadas. Se não gosto de índios ou de negros ou de asiáticos ou de albinos, trato logo de encontrar uma justificativa para minha repulsa. Não ponho à prova minhas crenças. Não as submeto ao escrutínio da razão. Se faço isso e concluo que estou equivocado, meu orgulho me impede de admitir isso até para mim mesmo e sigo me comportando como antes. Como é possível uma atitude assim?
Não só é possível como, provavelmente, predomina. Daí meu pessimismo. Em pleno século 21, ainda existe a necessidade de enfrentar o racismo e a homofobia (repito: para citar apenas dois exemplos, pois há muitos outros), de conscientizar pessoas para algo que deveria ser – reitero – intuitivo, óbvio. Não lhe causa preguiça? Em mim, muita preguiça! Não que ela me paralise, mas admito senti-la mais amiúde do que gostaria. Haja paciência! Pé no acelerador, humanidade! Se não, outra espécie menos autopredatória acabará deixando o homo sapiens sapiens para trás — o que, pensando bem, talvez não seja uma má ideia…
Muito bom sr Milhomem! A hipocrisia do ser humano nessas situações me deixa cada vez mais perplexo com a humanidade.
Valeu pelo comentário, Marra Marrento!
É, Luciboy. Esses são assuntos que já deveriam estar superados no mundo de hoje (2020). Eu acredito que o acesso à educação é a maior arma contra as ignorâncias e preconceitos que a sociedade carrega na vida. E como o nosso país tem um histórico de sucatear os sistemas de ensino público, em todos os níveis, fica difícil andar pra frente como um todo. Entretanto, essa é a nossa luta, a nossa pauta.
Forte abraço.
Fabiônico.
Valeu, meu caro. Grato pela leitura.