Na recepção do hotel, entro na fila. Horário de pico. Muita gente quer check-in ou check-out. Eu só quero uma informação. Nem por isso, sinto-me no direito de ir até o balcão, interromper o atendimento a um hóspede e tirar minha dúvida. Respeito o fato de ele ter chegado antes de mim. Aguardo minha vez.
Ao entrar no ônibus – um transfer do hotel para o aeroporto –, vejo dois assentos livres logo atrás da cabine do motorista. Penso em me sentar em um deles quando, de repente, noto a placa que indica serem ambos preferenciais a gestantes, idosos ou pessoas com deficiêcia. De imediato, busco outra poltrona.
Para meu incômodo — mas não para minha surpresa –, testemunhei, tanto em um quanto em outro caso, pessoas que não pensaram duas vezes: furaram a fila (“Quero só fazer uma perguntinha!”) e ocuparam (com os filhos!) os assentos preferenciais. Pela desenvoltura com que se comportaram, posso apostar que acharam suas atitudes naturais.
Reconheço que eu seria um chato se reclamasse de um tipo de situação que eu presenciasse muito raramente. Só que não. Testemunho esse comportamento todos os dias. Literalmente. Infalivelmente. Aonde vou no Brasil, a qualquer hora, encontro conterrâneos prontos a cometer uma infração, das menos às mais graves.
O pior é que, via de regra, os filhos têm os pais como modelo. Então, a probabilidade de esse comportamento perpetuar-se é altíssima. As crianças viram o pai furar a fila da recepção do hotel para fazer uma pergunta, mesmo sem ele saber se a pessoa que ele interrompeu tinha problema mais sério para resolver. As crianças viram a mãe ignorar a sinalização de assento preferencial e atenderam ao pedido dela para ocupar aquele lugar no ônibus (quando havia outros disponíveis!). Inconsciência ou cara-de-pau?
Penso que há os dois casos, e um alimenta o outro. Certas pessoas simplesmente não enxergam o erro que estão cometendo. Mesmo que tenham noção da irregularidade, não a vêem como algo relevante. Minimizam a eventualidade de um dano para o outro (às vezes, até para si mesmas). Têm visão limitada. Nem por isso, são menos egoístas.
Já determinadas pessoas têm noção clara de estar infringindo uma norma – não uma norma estúpida qualquer, mas uma norma necessária ao bem estar da maioria. Rasgam o contrato social por cinismo. Em termos mais grosseiros: são abusadas. Só pensam no próprio umbigo e esperam contar com a compreensão dos outros para seguir assim.

Por que penso que um caso alimenta o outro? Ora, em determinadas circunstâncias, não há como distinguir o inconsciente do “folgado”. Portanto, enquanto houver inconscientes prontos a burlar as regras mais razoáveis, haverá cínicos dispostos a se passar por eles, ou seja, espertalhões que se fingirão de bobos.
Será que sou um moralista hipócrita por sentir indignação quando presencio pessoas agirem como se o planeta fosse só delas? Claro que também erro! Cometo infrações. Acontece que essa não tem sido a regra em minha vida, mas a exceção. Ademais, tenho me esforçado sinceramente para me tornar menos egoísta junto à coletividade.
Conheço pessoas que conseguem respeitar o espaço dos outros sempre. Sim, elas existem! Respeitar os direitos do outro é possível. Basta que os inconscientes prestem atenção no que estão fazendo, e os cínicos recebam a punição devida – ainda que seja apenas um “chega-para-lá” de quem não aceita malandragem.
Falta de acesso à informação não pode ser mais desculpa. Quem para o carro ao lado de uma placa de Proibido Estacionar ou de Vaga Preferencial só precisa saber ler. Se não sabe, jamais poderia ter tirado a carteira de motorista. Melhor eu parar por aqui ou logo quem parecerá cínico sou eu. Até mais!
concordo!