Admito que já fui noveleiro. Um dia, levei novela tão a sério que cheguei a defender uma dissertação de mestrado sobre telenovela brasileira. Com o tempo, passei a assitir somente às novelas mais divertidas. Afinal, para mim, elas são mero entretenimento. Atualmente, não acompanho nenhuma. Quando me sobram tempo e paciência, vejo os primeiros e os últimos capítulos. Isso tem bastado para me convencer de que, independentemente de audiência, as telenovelas brasileiras precisam mudar.

Creio ser questão de tempo para esse império das telenovelas ruir, a menos que se recicle. Com poucas exceções, as tramas têm batido sempre nas mesmas teclas: filhas ou filhos que, adultos, descobrem seus verdadeiros pais; disputa entre irmãos pelo controle da empresa da família; prisões injustas (toda telenovela brasileira não resiste a meter algum personagem na cadeia, geralmente o protagonista); riqueza perdida e depois recuperada; relacionamentos clandestinos; a descoberta de uma doença grave que provoca reviravolta na vida de personagens.
As emissoras de TV ainda têm a seu favor os elevados índices de audiência (já foram melhores…) de suas novelas. Mas insisto que pode ser apenas questão de tempo para o público atual desses folhetins eletrônicos seguir os passos de quem já prefere assistir aos seriados da HBO, da Fox, da Netflix.
A própria TV Globo, responsável pela maior quantidade de novelas do país, parece ter-se dado conta disso e tem investido em minisséries mais criativas, que vêm dando o que falar, como a recente “Felizes para Sempre?”. De qualquer forma, enquanto significativa parcela de seu público ainda aprecia os velhos folhetins, a emissora mantém no ar as tramas de sempre. Muda autores, cenários, atores, contextos, mas “todo dia, ela faz tudo sempre igual”, como na canção de Chico Buarque. E lá vêm cadeia, disputas familiares, paixões exacerbadas, figuras caricatas (os gays têm sido a bola da vez).
Em “Amor à Vida” (2014), o vilão Félix armava arapucas para o pai e a irmã porque cobiçava a direção do hospital San Magno, da família. Em “Império”, José Pedro fez praticamente o mesmo, com a agravante de ter cometido um parricído no final. Ao menos Félix era divertido, soltava comentários que geravam brincadeiras nas redes sociais.
Não basta exibir uma trama com a maioria de atores e atrizes negros, como a angolana “Windeck”, atualmente no ar pela TV Brasil. Ainda que tenha o mérito de valorizar um elenco majoritariamente negro, a novela, do ponto de vista de narrativa, distingue-se muito pouco da maioria de suas congêneres brasileiras.
Das duas uma: ou as emissoras apostam em inovação e levam ao ar novelas verdadeiramente marcantes, como “Beto Rockfeller” (1968/69), “Pantanal” (1990) e “Avenida Brasil” (2012), ou desistem do gênero e concentram a teledramaturgia em minisséries e seriados, cujas tramas costumam ser mais ágeis, instigantes, irreverentes. Se mantiverem a velha fórmula, as telenovelas brasileiras correm o risco de ver sua audiência cair a ponto de entrarem para a história como o Comendador de “Império”: poderosas por muito tempo, mas fantasmagóricas no final.