Ganha um doce quem nunca teve um amigo ou amiga que, ao começar a namorar, sumiu do mapa! Ganha dois doces quem nunca ficou incomodado com isso! Eu disse “incomodado”, não “enciumado”.
O enciumado é infantil. Não compreende a situação. Sente-se repentinamente abandonado e até mesmo traído. Não entende que um casal em começo de relação está empolgado, se conhecendo, eventualmente suprindo carências reprimidas. O enciumado é, antes de tudo, egoísta. Só vê o lado dele.
O incomodado é diferente. Compreende a situação. O que o incomoda está mais no plano do pensamento que no do sentimento, menos ainda no da emoção. Ele interpreta o afastamento paradoxalmente como algo natural e exagerado. Analisa a postura do amigo ou amiga com certa frieza. Vê longe. Suspeita de que o excesso de contato do casal hoje pode ser a causa de atritos (e até de separação) amanhã. No fundo, trata-se de preocupação mesmo, não de ciúme.
Os amigos e amigas em fase de lua-de-mel com seus pares dificilmente entendem tanto os enciumados quanto os incomodados (ou preocupados). Íntima ou explicitamente, exigem compreensão e paciência dos amigos. Não estão nem aí para o futuro. Querem gozar o presente. Querem aproveitar ao máximo o momento. Os amigos que esperem!
Amigos, para muita gente, são como jogo ganho, vitória garantida. Aconteça o que acontecer, lá devem estar eles, sempre prontos e à espera para apoiar, ajudar, compreender. São quase como mães. Devem amar incondicionalmente. Diferentes de plantas, animais e filhos, os amigos, para essas pessoas, não demandam atenção constante. Devem sobreviver à seca, ao frio, à distância, a quase tudo.
Tenho críticas a essa maneira de pensar. Admito que me enquadro entre os incomodados (ou preocupados) quando vejo amigos ou amigas completamente mergulhados em uma relação, sobretudo se ela não é recente. Já me explico!
Em primeiro lugar, acho natural o afastamento de amigos ou amigas em namoros novos, isto é, ainda em suas primeiras semanas. Mas acho exagerado o chamado “grude” após essa fase. Parece haver no casal certo deslumbramento que nada tem que ver com amor, mas com paixão, com “fogo de palha”.
Em segundo lugar, penso que se afastar demais dos amigos é um erro estratégico. O isolamento do casal pode representar certa alienação. Afinal, o casalzinho apaixonado vive um mundo à parte e certamente fantasioso, que inventou para si. Distancia-se da realidade. Acontece que, em algum momento, a realidade se imporá novamente com toda sua força, e a “ilha da fantasia” desaparecerá. Os resultados disso não costumam ser positivos…
Em terceiro lugar, o afastamento de amigos e amigas gera uma dependência desnecessária entre os dois apaixonados. Afinal, quando se afastam “do mundo”, os amigos e amigas deles tocam suas vidas, estabelecem novas relações, deixam de contar com quem deles se afastou. Se o distanciamento durar muito, a retomada da amizade poderá ser difícil ou mesmo impossível. Ademais, cada um no casal deixa de ter vida própria. Depende um do outro cada vez mais. Isso definitivamente não me parece sadio. Ninguém supre cem por cento as necessidades de ninguém.
Em quarto lugar, desconfio de que o tal “grude” alimenta o risco de o casal se cansar um do outro – ou de um dos dois se cansar do parceiro ou da relação entre eles ou de ambos (parceiro e relação). Retomo a analogia do “fogo de palha”: queima depressa, passa logo. É, em um primeiro momento, forte, alto, ruidoso, gera muita luz e fumaça, mas acaba em pouco tempo.
Em quinto e último lugar, parece-me egoísta pensar que os amigos devem estar sempre à espera, prontos a acolher o amigo ou a amiga quando ele ou ela se cansar do parceiro – ou terminar o namoro. Amigo não é pneu estepe. Não é mera falta de opção. Amizade deve ser via de mão dupla. Deve ter valor em si mesma. Não pode ser descartável, como um objeto que só se utiliza quando se precisa dele. Amizade também demanda e merece cultivo.
Conheço casos de pessoas que namoram, casam-se, têm filhos e, ao longo desse percurso, afastam-se totalmente de amigos e amigas, sobretudo dos solteiros, que não seguiram o mesmo caminho e, portanto, não levam a mesma vida. Buscam a presença apenas de outros casais. Passam a conviver somente com grupos semelhantes. Parecem esquecer-se completamente de que relações podem terminar e de que eles podem precisar, de novo, da companhia dos amigos e amigas desimpedidos.
Parecem esquecer-se também da importância de ter, em suas relações, “válvulas de escape”, “janelas” para respirar outros ares, oportunidades de conversar sobre outros assuntos, continuar desbravando o mundo. Essa abertura aos amigos é útil para a própria sobrevivência e saúde da relação do casal. É uma pena que muitos não enxerguem isso! Enclausuram-se em seus feudos, protegendo-se de sei lá o quê!
Muitos homens e mulheres, especialmente os inseguros, acham que, isolando-se dos amigos e amigas solteiros, garantirão a fidelidade no relacionamento. Ingênuos, esquecem-se de que as chamadas traições podem ocorrer a qualquer momento, em qualquer lugar, quando menos se espera – as oportunidades para isso aparecem até em sinal de trânsito fechado!
Felizmente, tenho casais amigos – sobretudo um muito próximo – que nunca se afastaram de mim e de outros conhecidos mesmo no início da relação. Tiveram e ainda têm numerosos momentos a sós. Usufruíram e usufruem do mínimo de privacidade que a vida atual ainda permite. Mas incluem, amiúde, seus amigos em seus programas e, não raramente, divertem-se separadamente, cada qual com seu respectivo grupo.
Esses casais que acabo de mencionar respeitam a individualidade um do outro e não são românticos a ponto de achar que, apenas entre si, suprem todas as suas necessidades. Entendem que cada um precisa de momentos a sós ou na companhia de amigos. Não compartilham entre eles cem por cento de seu tempo nem de suas vivências. Permitem-se ter vida independente. Se, um dia, separarem-se, certamente sofrerão, mas terão melhores condições de seguir adiante. A separação deles será menos traumática, e a recuperação, mais fácil.
Acontece que casais assim não costumam se separar. Ou demoram muito a separar-se, justamente porque não controlam os passos um do outro. Não sufocam um ao outro. Graças às janelas e portas que abrem ao mundo, respiram. Parafraseando o poema de Vinícius, esses casais sabem que, mesmo que se afastem um dia, poderão dizer do amor que tiveram que não foi imortal, posto que era chama, mas que foi infinito enquanto durou.
Eu já tive uma experiência semelhante de u’a amiga de sair até para dançar… e depois que arranjou um namorado se afastou… e é claro que eu fiquei incomodada, porque penso que
não se deve separar dos amigos assim tão abruptamente, sem explicações.
Outro dia recebi uma mensagem dela dizendo que precisamos nos encontrar…. vamos ver, acho que pelo menos a lembrança e a vontade de se aproximar está acontecendo. Veremos…
Pois é… Quem nunca viveu ou vive essa situação?