No último dia 26 de setembro, uma quinta-feira, a novela “Amor à Vida” deu um salto no tempo. Passaram-se aproximadamente nove meses para que três grávidas – Aline (Vanessa Giácomo), Amarilys (Danielle Winits) e Valdirene (Tatá Werneck) – pudessem dar à luz seus respectivos bebês. Cada uma pertence a um núcleo diferente da trama de Walcyr Carrasco. Cada uma está no olho de um furacão, que mistura dezenas de temas e vira a história de ponta-cabeça.
Aline integra o núcleo mais importante e tumultuado, o da família Khoury, do qual também fazem parte o patriarca César (Antonio Fagundes), sua mulher Pilar (Suzana Vieira), seu filho Félix (Mateus Solano) e sua filha Paloma (Paola Oliveira), além de alguns agregados mais ou menos importantes na história.
Apenas nesse núcleo, Carrasco desenvolve seis temas principais e outros tantos secundários. Os principais: infidelidade conjugal (César traiu Pilar com Aline e com outras antes dela; Félix trai a mulher com um rapaz, e a mulher o trai com o mordomo); divórcio litigioso (César e Pilar); homofobia (César discrimina Félix, o filho homossexual); vingança (Pilar e Félix querem vingar-se de César e Aline, e esta quer em segredo a desforra de toda a família Khoury); cobiça (Félix não tem escrúpulos para tentar chegar ao comando do hospital do pai); seqüestro e abandono de bebê (Félix desaparece com a própria sobrinha); reencontro entre mãe e filha (Paloma reencontra a filha treze anos após o seqüestro da menina, assim como só descobre a verdadeira mãe depois de adulta).
Já Amarilys pertence a um núcleo secundário, mas que tem ganhado espaço em “Amor à Vida”, especialmente por causa dos temas que desenvolve e do potencial explosivo que representa: o do casal homossexual Eron (Marcello Antony) e Niko (Thiago Fragoso). Além do tema ‘união estável entre homossexuais’, Carrasco explora, nesse núcleo, questões como paternidade homossexual (Eron e Niko decidem ter um filho); inseminação artificial (Amarilys tenta engravidar por esse método); barriga solidária (Amarilys empresta a barriga para gestar um filho do casal gay); bissexualidade (Eron não resiste à sedução de Amarilys), adoção por casal homossexual e, de novo, discriminação contra homossexuais (César, empregador de Eron, não aceita que seu funcionário assuma publicamente a relação com Niko). Quando Niko descobrir a dupla traição – da amiga Amarilys com o marido Eron –, tudo pode acontecer, e mais temas entrarem na história.
O turbilhão de temáticas atinge até mesmo o núcleo cômico da novela. Valdirene divide com a mãe, a ex-chacrete Márcia (Elizabeth Savalla), e o namorado Carlito (Anderson Di Rizzi), situações divertidas, mas nem por isso menos problemáticas: a decadência de subcelebridades (caso de Márcia, um dia aclamada como Tetê Parachoque-Paralama); as dificuldades dos vendedores ambulantes (Márcia e a filha vendiam cachorro-quente na rua); a má fama das “periguetes”; e os golpes do baú e da barriga (Valdirene, por pressão da mãe, faz de tudo para seduzir e prender um milionário, o que acaba conseguindo).
Como se todos esses temas não bastassem, o autor de “Amor à Vida” inflaciona a trama com questões como tráfico internacional de drogas, câncer de mama, amor na terceira idade, descoberta de falsa paternidade, hiper-sexualidade, rejeição, amnésia temporária, falsidade ideológica, bigamia, gerundismo, obesidade, discriminação contra obesos, decadência financeira, virgindade feminina na fase adulta, “alpinismo” social, mediunidade, autismo, conflito judeu-palestino, gigolagem, sadomasoquismo, preconceito contra relação entre mulher mais velha e rapaz mais novo, assédio moral, entre outras.
Evidentemente, seria impossível construir uma narrativa sem incluir nela diversos temas. Eles são inevitáveis, até porque fazem parte da vida real. Mas a inflação deles torna a história dispersa, confusa, demasiadamente superficial.
Não é de estranhar que Walcyr Carrasco e seus colaboradores acabem esquecendo-se de alguns temas por muito tempo. Fica claro para o telespectador que eles perderam o controle da história. Daí as longuíssimas e cansativas seqüências com a dupla Márcia e Valdirene e a menor relevância do casal principal Bruno (Malvino Salvador) e Paloma, que se torna secundário durante vários capítulos.
Curiosamente, nada indica que a inflação de temas vá cair. O romance entre Herbert (José Wilker) e Gina (Carolina Kasting) esquentou. O que parecia ser um incesto talvez siga outro caminho. Ainda não se sabe. Os noveleiros de plantão que se preparem. Vão precisar de muita atenção e paciência até o desfecho de “Amor à Vida”.
Muito apropriado!
Palavra de especialista no tema!