Poucos filmes me levam a vê-los uma segunda vez. Fight Club (Clube da Luta) está entre eles. Lembro-me de tê-lo visto quando estreou no cinema em 1999. Mais de uma década depois, deparei com o DVD numa dessas promoções irresistíveis das Lojas Americanas.
Repousou na minha estante por alguns meses até que senti vontade de revê-lo. Sou assim: compro um filme, mas só o vejo quando realmente me dá vontade. Tenho de estar no clima. Foi o caso ontem e tive a satisfação de rever Clube da Luta. Recomendo-o enfaticamente. Já digo por quê.
Clube da Luta é um desses filmes que conseguem a proeza de reunir com êxito ação e reflexão. Como o próprio título indica, há muita pancadaria. Só que, diferentemente da maioria das fitas do gênero, nele não há socos, chutes e pontapés gratuitos. Eles são a essência da história. Melhor: são elementos para reflexão. Mas compreender isso depende de analisar um pouco a trama, baseada no livro homônimo de Chuck Palahniuk.
Jack, personagem de Edward Norton, sofre de insônia. É um jovem executivo que atua como investigador de seguros. Viaja muito a trabalho. Vive só. Não tem amigos, namorada, noiva, esposa, nem filhos. Tampouco se relaciona com os colegas de trabalho. O chefe é, para ele, o que os americanos costumam chamar de “pain in the ass” (o equivalente mais próximo em português seria “pé no saco”).
Frustrado, Jack compensa parte da monotonia da vida com o consumo de produtos para casa. Seu apartamento parece uma vitrine da Ikea (grande loja de móveis e produtos domésticos em geral). Além do consumismo, Jack busca alívio em diversos grupos de apoio, como um voltado para homens com câncer nos testículos (doença que Jack não tem). Ouvir o sofrimento dos outros ajuda-o a suportar a própria dor (ou seria a própria solidão?).
Em uma de suas viagens a trabalho, Jack conhece Tyler Durden, papel de Brad Pitt. Durante o vôo, mantêm conversa típica de viajantes que normalmente nunca se encontrarão de novo. A certa altura, Tyler entrega seu cartão a Jack. Está selado o destino de ambos. Horas depois, Jack procura Tyler porque, ao chegar à porta do condomínio onde mora, descobre que seu apartamento foi pelos ares após incêndio aparentemente acidental. Resultado: Jack vai morar com Tyler em uma casa abandonada, caindo aos pedaços. Tem início aí a reviravolta na vida de Jack.
Não é minha intenção plantar um spoiler neste artigo. Não pretendo relatar o final da história para quem ainda não viu o filme. Parto, então, para uma breve análise de elementos essenciais do roteiro. O leitor pode complementá-la sozinho. Recomendo apenas que observe o seguinte:
1- Excesso de trabalho. Estresse. Solidão. Insônia. O que uma combinação como essa pode provocar na mente de uma pessoa?
2-Consumismo. A certa altura, o personagem Tyler Durden faz o seguinte comentário: “Compramos coisas de que não precisamos, com dinheiro que não temos, para impressionar pessoas de quem não gostamos.” Ele está convencendo Jack a mudar de mentalidade — e de vida.
3- Opressão. Repressão. Explosão. Catarse. O filme de David Fincher, certamente inspirado no livro de Palahniuk, dá a entender que um homem oprimido e reprimido precisa, pode e deve explodir. Busca, então, uma forma de catarse. Eis onde entra o Clube da Luta… Bater alivia. A dor física ajuda a esquecer a dor espiritual.
4- Autoestima. Alter-ego. Quem não gosta de si como é pode sempre buscar inspiração em outra pessoa ou mesmo imitá-la. Pode-se levar isso ao extremo e adotar um alter-ego. A baixa autoestima pode conduzir à procura de um ego alternativo, isto é, uma personalidade diferente. Faz sentido.
5- Destruição e autodestruição. Catarses mal administradas podem levar à destruição, à autodestruição ou a ambas.
Ao clube dos estressados, solitários, oprimidos e reprimidos, só resta uma catarse sangrenta. Pode-se formar um exército com quem dá murro em ponta de faca para sobreviver. Porrada por porrada, que se bata e se apanhe em troca de algum alívio. Não é questão de certo ou errado. É questão de causa e de conseqüência.
Clube da Luta faz ou não pensar?
Filme muito bom, uma sucessão de ironias que dazem o especrador a toda hora se ajeitar no assento a todo komento. É fantástica, por exemplo, a história do sabonete emagrecedor que tem como matéria os rejeitou roubados do container de lixo de uma clínica de lipoaspiração.
Grato pelo comentário, Luís Cláudio! Abraço.
E o sabonete emagrecedor feito com a gordura roubada dos containers de lixo de clínicas de cirurgia plástica?! Lembra disso?
Sim.