Recebi com surpresa a notícia de que um casal de amigos acaba de se separar. Viveu sob o mesmo teto por três anos, após seis de namoro. Estive no casamento: luxo, sofisticação, elegância e, principalmente, alegria. Ela e ele pareciam radiantes. Eu jamais poderia imaginar que os dois viessem a se divorciar pouco tempo depois.
O caso me toca porque, até onde sei, não faltavam, no relacionamento deles, aqueles componentes típicos em casais que brigam muito: afeto, respeito e dinheiro. Ambos nutrem respeito e carinho profundo um pelo outro e têm situação financeira bem acima da média. Apesar da separação, acredito haver amor entre eles. Por que, então, cada um seguiu o próprio caminho?
Ela me explica: faltava paixão. O calor dos primeiros anos se foi. A relação estava mais próxima da amizade. Ele parecia não se importar muito com isso. Ela queria e quer mais do relacionamento com um homem. Tomou, então, a iniciativa de pedir a separação antes que sua insatisfação o magoasse. Ambos sentiram e ainda sentem a dor do divórcio, mas estão convencidos de que tomaram a decisão acertada.
A sede de viver intensamente, a necessidade de emoções fortes, a atração pela excitação das aventuras são mais intensas e profundas em algumas pessoas. Fase? Nem sempre. Há quem leve isso dentro de si por toda a vida. É uma característica do indivíduo. Negá-lo é como negar a própria identidade, a própria natureza. Pode-se reprimir essa característica, contê-la, mas não se pode eliminá-la. A repressão pode até aguçá-la. Ninguém foge de si mesmo sem pagar caro por isso.
Compreendo minha amiga que pediu a separação. Lamento por meu amigo que, em um primeiro momento, separou-se a contragosto. Suponho que, para ele, essa foi uma decisão aceita exclusivamente no âmbito racional. No âmbito dos sentimentos, foi um drama para o qual não devia estar preparado. Afinal, quem está preparado para o fim de um sonho, de um projeto de vida?
Não me atrevo a especular sobre o futuro dela e dele. Apenas suspeito de que ela não viva uma fase. Ela é como é. Gosta e necessita de fortes emoções. Não se satisfaz com uma vida pacata. Talvez, já idosa, busque o sossego, quando o corpo não mais acompanhar o ritmo dos desejos e pensamentos. Ou talvez cruze seu caminho um homem com seu mesmo ardor diante da vida. Imprevisível. Ainda bem. Fato é que a separação desse casal amigo confirma o que venho pensando há algum tempo: casamentos tradicionais exigem vocação. Não se pode nem se deve impô-los direta ou indiretamente.

A sociedade – ou parcela expressiva dela – ainda cobra do homem e da mulher adulta um casamento tradicional: vida sob o mesmo teto, filhos, compartilhamento de quase tudo (de positivo e de negativo), privacidade mínima, controle mútuo, dedicação exclusiva, renúncias e mais renúncias. Alguns buscam tudo isso. Esforçam-se para obtê-lo. Ao consegui-lo, sentem-se realizados. O tempo passa e não se arrependem. Esses têm vocação para o casamento tradicional.
Muitos outros, porém, ou não querem nada disso ou se deixam levar pelo desejo do parceiro, da família, da sociedade enfim, e acabam se frustrando em alguns anos (ou meses!). Há mesmo quem se culpe por não se casar ou por se separar, como se esse fosse um dever universal. Não vêem que modelos preestabelecidos de relacionamento não servem para todos, da mesma forma que não existe tamanho único que caia bem em qualquer um.
Tudo isso parece óbvio, mas tem causado muitos dissabores mundo afora e certamente continuará causando-os, com o apoio da família, da igreja, da escola, dos romances, das novelas e, sobretudo, da falta de autoconhecimento. Felizmente, alguns, como minha amiga, acordam em tempo de evitar sofrimento maior e dão, a si mesmos e aos outros, a oportunidade de recomeçar.
Gostei muito… e o final fechou com “chave de ouro… OPORTUNIDADE DE RECOMEÇAR.
Se temos esta oportunidade, por que não?