Entre o feijão e o sonho.

Há um ditado bastante maldoso sobre o ofício de professor: “Quem sabe faz. Quem não sabe ensina”. De falácias como essa vão se construindo alguns ditos populares. O fato é que eles acabam por simultaneamente espelhar e traduzir preconceitos que ainda giram em torno da profissão de professor.

 

“For the teacher”, pintura de Becky Alden.

 

Alguns preconceitos, claro, podem ser favoráveis. Há quem admire tanto a figura do professor que o coloque em um pedestal e se julgue inferior a ele e até incapaz de alcançá-lo.  Para alguns estudantes, tornar-se amigo do professor chega a ser símbolo de prestígio. Daí também as célebres adulações, como presentear o mestre com uma maçã vermelha lustrada, gesto clássico e simbólico, mais comum no passado.

No Brasil, o oposto dessa atitude ocorre com freqüência: estudantes de certas áreas menosprezam o professor por acharem que ele, se fosse bem-sucedido, estaria no mercado ganhando muito dinheiro e não ali, dando aulas e corrigindo provas. Será que não lhes ocorre que o ensino também integra o mercado de trabalho e que a ele é imprescindível?

 

Professor4

 

Lecionar é ofício tão ou mais relevante que projetar edifícios, administrar empresas, gerir pessoas, vender geladeiras. Pode haver profissionais mais felizes – e até mais bem pagos – em salas de aula do que em escritórios, hospitais, fábricas, consultórios. Muitas vezes, o magistério é uma escolha.

A despeito dos preconceitos, contra ou a favor, um fato a maioria parece reconhecer: sem professor, não há outro profissional. Mesmo um autodidata não aprende realmente sozinho. Além de utilizar livros e produtos audiovisuais (geralmente, obras de especialistas, a maioria professores), o “autodidata”, em algum momento, sentirá a necessidade de tirar dúvidas ou discutir temas ou simplesmente enxergar além da própria perspectiva. Entre seus pares, o “autodidata” nem sempre encontrará a resposta segura ou a pergunta desafiadora.

 

Autodidata

 

Idealmente, é na figura do professor que repousa a confiança, oriunda da experiência de aprender e de ensinar. Com o professor, pode-se, inclusive, aprender a aprender. Afinal, a ingestão indiscriminada de informações não garante verdadeiro conhecimento.

Todavia, também é inegável a existência de professores despreparados, que podem confundir e até mesmo traumatizar um estudante. Longe do desejável, eles lecionam o que não sabem – ou conhecem pouco a matéria que ministram ou, pior, são desprovidos de noções mínimas de pedagogia.

Geralmente, esse tipo ocupa uma lacuna: a dos que desistiram da carreira por não verem nela suficiente motivação. Salários baixos (sim, embora haja professores bem pagos, a maioria ganha pouco), perspectivas limitadas (sobretudo no Ensino Básico), insegurança (a violência nas escolas é maior do que parece), excesso de trabalho, são diversas as explicações dos que pulam fora do magistério.

 

Professor3

 

Por mais amor que um professor tenha à pedagogia, há casos em que o feijão pesa mais que o sonho. A solução, para muitos, está na renúncia ao magistério e na busca de carreiras financeiramente mais promissoras e respeitadas.

Nos níveis fundamental e médio de ensino, a desistência, por parte dos professores, parece ser maior que no nível superior, no qual salários, perspectivas, segurança e estabilidade parecem motivá-los mais. Ainda ali, porém, vêem-se greves freqüentes.

Seriam os professores mais propensos à reivindicação que outras categorias? Por quê? O mais provável é que, de fato, sintam-se menos valorizados que outros profissionais de formação equivalente ou inferior, porém com remuneração muito superior. O mercado dá as cartas. Valoriza mais quem faz do que quem ensina.

 

Greve_professores

 

O professor produz o quê? Novos profissionais parecem não ser o bastante. Pesquisas? Tampouco. Discussões que possam gerar novas idéias? Igualmente insuficientes para a pressa e a ganância do mercado.

Uma pena! O fato de haver maus professores não justifica salários aquém da importância do educador, menos ainda a desvalorização da carreira. Milhões de maçãs vermelhas  não bastam. Um dia de homenagem ao professor não basta. Quem lida com educação merece muito mais. Merece, ao menos, que o feijão alimente o sonho.

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